sábado, 11 de agosto de 2018

Inebrio

Desde que conheci a palavra êxtase, sempre a guardei com um certo carinho no rol das favoritas. Muito embora não dê nome ao texto, ela pode ser considerada, como bem diz o dicionário, o sinônimo de inebrio. Tão suprema quanto.

**A propósito, não julgue incoerente o parágrafo anterior. Deduzo que já deve ser de comum saber que sou a pessoa mais confusa que pode haver, e, talvez isso não seja o que há de pior.

Como dizia, sublime. Pois talvez tal vocábulo mereça esse posto dada a escassez de circunstâncias que nos provoquem a evasão de nós mesmos a algo transcendental. 

Meu caro leitor, sinto-me hoje um pouco mais sensível que os outros dias, então pensei que seria útil dar-te um olá com algumas palavras que emergem de meu âmago. Como tem sido raro o treino, o qual uma boa escrita demanda, espero que, ainda assim, seja capaz de transcrever algumas coisas tocantes.

Diz-me, há algo que te ponha inebriado? 

É tão insano pensar acerca disso, uma vez que nos dá a impressão de apatia, haja vista não sermos mais tocados tão facilmente ou, minimamente, prova-nos o quanto há menos coisas de fato valorosas para nós.

O que te deixa em êxtase? Já parou para pensar?
Aquela comida, carro, passeio? Aquela pessoa, lugar, imagem? Aquela música, aquelas sensações inexplicáveis, aquele maravilhoso sentimento de vida?

Inebriar é nos inquietar, é acordar o que outrora há tanto dormia com tamanha profundidade que pensavamos estar morto dentro de nós. Freud chamaria isso de recalque ou é engano meu?

Há tanto não sorriamos de tal forma e nos afetavamos com outras presenças. 

O acomodar-se nos impede de inebriar, impede-nos de vir o que há ao nosso entorno, impede de sorrir com maior plenitude.

Mas é essa uma palavra tão complexa, tão, de certo modo, traiçoeira. O que vem após o êxtase?
O que vem após a explosão de toda pura alegria que estava acorrentada? Há cansaço? há desespero? Há mais inebriar?
Epicuro, possivelmente, repreender-nos-ía ou somente a mim, pela apologia ao inebrio, mas em uma época de valores tão difusos e questionáveis, penso que até ele mudaria sua filosofia.

Há sempre luz, mesmo nas noites mais escuras
E sempre há felicidade à espera de nosso regozijo. No entanto, somos progressivamente tão mais cristalizados pelo espírito de nosso tempo, que acabamos por desaperceber tudo que de melhor nos é proporcionado rotineiramente.

Rotineiramente, pois a vida, mesmo daqueles que muito fogem, é uma rotina. E rotina não precisa ser um termo depreciativo e ínfimo do que, de fato, é a nossa vida. Ele não precisa nos causar repulsa ou tédio só em sua pronúncia. Induzindo-nos a pensar que é somente na fuga à rotina que a felicidade se faz presente. Pensar assim é não somente sabotar-se, mas fechar os olhos para a felicidade. Uma vez que a felicidade não vem a nós, somos nós quem vamos até ela.

Sim, é verdade. Pensa bem, suponha que nos guardemos durante todos os dias ditos úteis para que no sábado ou domingo possamos fazer algo de que gostemos, como: ir à praia ou cinema ou parque...E vamos dispostos a dar o nosso suor para que fiquemos inebriados. Enquanto isso, passam-se segundas e terças e quartas e quintas..e com eles as felicidades guardadas para cada dia, não aproveitada ou, caso sim, não em sua plenitude. Haja vista compor nossa rotina,sendo, portanto, "algo menor", talvez pensemos.

Por que não se inebriar com um sorriso de um estranho ou de uma pessoa no coletivo cuja história lhe tocou e você acabou dando suas moedas da água de coco e recebendo um sorriso de agradecimento?
Por que sintetizar, simplificar coisas e pessoas e acontecimentos tão significativos à espera de algo que se julga muito maior e que, talvez, não possa, no fim das contas, ser tão superior à soma ou individualidade de cada uma dessas felicidades?

Inebrie-me_Peço à vida. _Deixe-me em desalinho quanto a esse agir socialmente aceito e naturalizado. A vida é tão mais, mas somos sugados por nossos arredores.
-Palavras_eu digo. _Palavras.
Pois são elas tão ricas  e poderosas. São elas tão impactantes e provocativas de emoções outrora desprestigiadas. São elas capazes de nos fazer notar o quão estamos sendo tolos.

-Hoje foi um excelente dia_E, de repente, a felicidade sente-se reconhecida a ponto de nos trazer mais desses. -obrigada_agradeça

Agradeça, pois é tão difícil o despertar, que somos levados a acreditar que só há transcendentalidade no que está além de nosso dia a dia. Note e aproveite. Haja vista ser tudo muito efêmero e se não dignarmos nosso melhor a reconhecer e desfrutar, perderemos a sensibilidade para inebriar.

#UmaHeliofóbica